Uma família escolhida

Todo e qualquer ser humano quando nasce, ganha de brinde uma família, começando pela sua mãe e seu pai, e a reboque vem os demais, irmãos, primos, tios e etc. No entanto, apesar de importante é uma família que nos é imposta pela natureza, uma família que não tivemos a oportunidade de escolher.

Algumas dessas pessoas que nascem, acabam crescendo e se transformando em motociclista de longo curso, ou melhor, motociclista estradeiro, e aí começam as viagens, quase sempre acompanhadas de outros cidadãos e cidadãs que também optaram pelas viagens motociclisticas, e com as viagens começam a acontecer fatos, tais como pneus que furam no meio do nada, são as alegrias dos encontros com os demais motociclistas, são os acidentes que vez por outra acontecem, enfim diversos fatos que vão unindo grupos de motociclistas que participam daqueles fatos, e assim passo a passo vamos percebendo afinidades, tais como o modelo de moto preferido, a velocidade com que cada um conduz sua máquina, a preferência por locais a serem visitados, as bebidas prediletas, os rocks que gostamos de ouvir, e com isso acabamos escolhendo uma família, família essa que não possui qualquer laço sanguíneo, qualquer interesse material, muitas das vezes nem a família biológica conhece os componentes da família escolhida. São familiares escolhidos por suas características pessoais que vão sendo demonstradas nas viagens, festas, encontros, mas principalmente nos momentos de infortúnios, que é quando temos a oportunidade de mostrarmos como realmente somos.

No último dia 13 de agosto comemorei meus 66 anos, e promovi uma pequena comemoração para alguns amigos motociclistas, e a mesma aconteceu. Reunimo-nos num boteco na Rua Ceará, para quem não conhece essa Rua, ela fica próxima a Praça da Bandeira, que é o reduto motociclistico mais antigo do Rio de Janeiro.

A comemoração estava rolando ao sabor de umas biritas, linguicinhas fritas, queijo e alguns caldinhos quentes, éramos aproximadamente uns 30 motociclistas estradeiros, quando de repente me abstraí um pouco e fiquei a distância observando aqueles homens, velhos guerreiros da estrada sorrindo felizes, batendo um papo, cada um contando suas histórias de motos e viagens. Acompanhado de muitas piadas e risadas.

A cada rosto que eu olhava, me vinha na memória histórias que passei em viagem com cada um deles. Um me recordava uma viagem acidentada, outro me fazia lembrar um porre que tomamos juntos em alguma localidade em que estávamos, outro me recordava uma ajuda que ofertamos a um motociclista desconhecido que estava em apuros, teve outro que me emprestou um dinheiro para abastecer a minha moto, quando meu dinheiro acabou em viagem. Havia aquele outro que tive que tomar a chave da moto, pois o mesmo queria pilotar bêbado como um gambá. Enfim, cada componente de minha família escolhida tinha uma história que nos uniu. E que família maravilhosa que eu escolhi. De uma maneira ou de outra, estávamos todos nós ali irmanados no mesmo ideal de sermos felizes e fazermos tantas outras pessoas felizes por onde passamos e ainda passaremos com nossas máquinas Sempre com o espírito livre de preconceitos e vaidades, pois a estrada nos impede de exercer vaidades, muito pelo contrário nos faz sermos humildes, pois entendemos muito rápido que somos apenas uma gota d’água no oceano, pois o contato com a natureza nos mostra a nossa pequenez com relação ao mundo e a grandeza que podemos exercitar em filantropia e fraternidade.

Amigo motociclista, escolha bem a sua família e a preserve, pois nas estradas se não agirmos como uma família amorosa, respeitadora e colaboradora das demais famílias, existirão momentos em que as viagens não serão felizes como devem ser todas as viagens familiares.